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Los dos amigos, Angeli e Laerte reúnem-se com jovens artistas antes da mesa principal na FLIP

Los dos amigos, como foi intitulada a mesa surpresa dos cartunistas Angeli e Laerte na 10 a . edição da Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP), foram solidários aos novos artistas e participaram de uma oficina de quadrinhos antes da mesa principal, realizada no sábado à noite.

Durante dois dias – sexta e sábado – os cartunistas se reuniram com cerca de 30 jovens interessados em dicas e relatos de suas experiências profissionais. Para participar do oficina, além da inscrição, os participantes enviaram previamente uma ilustração própria para ser avaliada.

Quem estava esperando uma oficina nos moldes convencionais, porém, errou. No primeiro contato com os participantes, os cartunistas se espantaram porque todo mundo estava com material de desenho a postos. “Não tem como ensinar a desenhar tirinhas. Se esse processo existe, nós ainda não sabemos”, disse Laerte. Ele também comentou que quando era jovem, procurava oficinas de quadrinho para fazer, mas não havia tanta oferta como hoje. Com o tempo foi percebendo que isso não importava. “O autodidatismo impera na arte hoje. Os melhores materiais publicados atualmente são dessas pessoas”, concluiu.

Além de contar um pouco sobre como começaram a desenhar, de métodos e técnicas, deram referências de outros cartunistas que consideram bons na área. O desenho encomendado, fato comum no meio profissional hoje, foi questionado pelos participantes. Angeli deu o exemplo do livro Avenida Paulista, de Luiz Gê. Segundo ele, foi um trabalho encomendado inicialmente com sete páginas.

Quando o autor foi entregá-lo, havia se transformado em 100 páginas. Depois disso, o material foi publicado em forma de livro.

Sobre a censura, os dois contaram alguns casos que sofreram. Angeli fez uma tira de um cara que esfaqueava a mulher, sujava de sangue a casa e, no final, falava a ela: “limpe isso aí”. O editor, na época, não quis publicar porque um caso verídico estava no jornal no mesmo dia. Mas foi publicado uma semana depois. O Laerte quis publicar certa vez uma tira de cowboys gays que queriam engravidar pra ter o direito de abortar. Mas o editor considerou polêmico demais.

Falando de personagens famosos, Laerte foi questionado porque desistiu de seus personagens característicos (desde 2005 o cartunista faz histórias sem os personagens mais marcantes que criou). “Antigamente nós cartunistas trabalhávamos para muitos jornais. Hoje, trabalho só para quatro. Como dou preferência às histórias e tenho certa dificuldade com os desenhos, para mim não faz tanta diferença se eu perder um jornal por conta desse ou daquele personagem. Me dou esse direito”.

Em relação à construção dos personagens, Angeli contou sobre o processo da Rêbordosa, seu personagem mais famoso. “Eu estava de ressaca, fiz o desenho e ele foi publicado. Aí passei a receber cartas elogiando o personagem e pedindo para continuar com ele. É engraçado porque as pessoas têm a ideia de que quando se faz um desenho, já tem toda a história pronta junto com ele. E para mim não funciona assim”, contou.

Os cartunistas ainda revelaram que têm um projeto de lançar uma revista juntos, como nos velhos tempos. Já ofereceram a alguns veículos, mas ainda não conseguiram patrocínio.

O designer Lucas Busto que participou da oficina, disse que a experiência foi bacana. “Todo mundo saiu de lá com vontade de desenhar. O Angeli, por exemplo, disse que sente necessidade de estudar muito ainda, que treina seu desenho todo dia e que acha que ele ainda não está bom. É incentivador e, ao mesmo tempo, um tapa com luva de pelica naqueles iniciantes que já se consideram prontos”.

No final da oficina, os cartunistas disponibilizaram um email para os participantes enviarem seus

trabalhos. “Quando vocês começarem a desenhar, já mandem pra gente. A gente vai fazendo junto”, avisou Angeli.

Mesa concorrida no sábado à noite

Uma das mesas mais concorridas, Laerte e Angeli esgotaram os ingressos da Tenda dos Autores, da Tenda do Telão e, ainda, o espaço ao ar livre em volta do telão de onde se conseguia também acompanhar o bate papo. E o clima foi bem esse: um bate papo entre amigos mediado por Claudinei Ferreira, do Itaú Cultural.

Quebrando o gelo inicial depois de uma discussão sobre o termo “humorismo “e seus rumos, como o stand-up, os cartunistas passaram a falar sobre seus processos de trabalho. Laerte contou que hoje não tem mais compulsão por desenhar e que se sente até mal quando precisa passar do roteiro para a parte do desenho. Angeli, ao contrário, disse que para ele o processo é mais que natural, desenha a toda hora, está sempre com a prancheta em mãos.

Entre as várias passagens em que arrancaram risos da plateia, Angeli revelou que sua memória não anda muito bem ultimamente. “Fumei muito orégano”, afirmou, provocando riso geral.

A questão do crossdressing de Laerte também não escapou das perguntas do público. Questionado se o ato de se depilar era considerado machista, ele disse que a feminilidade é um modelo criado, tanto do lado masculino quanto do feminino. “Depilar não é machista, é só uma opção”, disse. A plateia ainda quis uma dica de moda de Laerte. A última pergunta do público foi: “Laerte, onde você comprou esse vestido?” Fechando com risadas a última mesa do sábado.